O dinheiro não compra amizade e, por vezes, causa disputas entre velhos amigos.
O dinheiro não compra amizade e alianças construídas em torno dele, por vezes, demonstram ser frágeis, como um teto de vidro. Este é o caso da relação entre Donald J. Trump – atual presidente dos Estados Unidos – e o multibilionário, dono de empresas como Tesla e SpaceX, Elon Musk. Portanto, aquilo que parecia ser uma aliança robusta e próspera acabou exibindo suas rachaduras.
A relação entre os dois bilionários começou a ocupar um espaço de destaque midiático durante a campanha presidencial dos EUA, ocorrida em 2024. Ademais, a aliança entre os dois é marcada por promessas que mostraram-se falsas e muitos financiamentos. Por exemplo, segundo a BBC News Brasil, Musk declarou um apoio incondicional ao presidente republicano e seu desejo de ocupar Washington após a tentativa de assassinato que o último sofrera durante a corrida eleitoral. Além disso, segundo o mesmo portal informativo, as doações de Musk a Trump e outros republicanos totalizam mais de R$ 1,6 bilhão. Em contrapartida, é factível o espaço que o presidente dos EUA deu a Musk na construção de seu governo, inclusive o incumbindo com poderes institucionais. A saber, o sul-africano foi responsável pela criação do DOGE (Departamento de Eficiência Governamental), voltado para cortes de custos, e teve ampla liberdade para escolher os funcionários que compõem a instituição. Inclusive, diversos dos burocratas que ocupam o DOGE foram, outrora, ligados a Musk – através de suas empresas. Além disso, as empresas de Elon também são ligadas ao governo dos EUA, através do financiamento feito pelo Estado às corporações. Segundo análise da BBC Verify, somente a SpaceX recebeu mais de R$ 116 bilhões em contratos com o governo desde 2008. Vale ressaltar que o governo dos EUA possui ligação com as empresas de Musk, porque elas ocupam uma importante posição na construção do plano estratégico do governo. Por exemplo, a Space X fornece seus produtos para o auxílio de operações comandadas pela Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (NASA), agência espacial dos EUA, responsável por pesquisas e exploração do espaço.
Nesse sentido, é interessante ressaltar que os dois levavam, até pouco tempo atrás, uma relação simbiótica de apoio político e financeiro. Não obstante, a relação findou-se com a divulgação do projeto orçamentário proposto pelo presidente republicano, One Big Beautiful Bill. A iniciativa provocou uma série de impressões negativas para Musk, que criticou publicamente o projeto em sua rede social, X. Em contrapartida, segundo a BBC News, Trump retrucou as ofensivas proferidas por Elon através do Truth Social, ameaçando cortar os subsídios recebidos pelas empresas de Musk, ao utilizar o DOGE – que foi criado pelo sul-africano, dizendo: “A maneira mais fácil de economizar dinheiro em nosso Orçamento, bilhões e bilhões de dólares, é encerrar os subsídios e contratos governamentais de Elon Musk. Sempre me surpreendi que Biden não tenha feito isso!”.
Como dito anteriormente, o conteúdo do projeto orçamentário One Big Beautiful Bill foi propulsor para a rachadura entre os dois. No entanto, o que está previsto nele? Primeiramente, é um projeto que, segundo o canal midiático Exame, prevê uma série de investimentos de peso e de mudanças fiscais. Trump, que foi incisivo na promessa de redução de impostos e do déficit público, encontra-se defronte a opositores políticos que argumentam que o contrário irá acontecer à população estadunidense, com a aprovação do projeto, que ocorreu no dia 01/07/25. Mais detalhadamente, a Big Beautiful Bill prevê estimular o crescimento econômico por meio do investimento em infraestruturas, além de mudanças fiscais, como a redução de impostos, para incentivar a inovação e competitividade dos EUA. Segundo o republicano, é por meio de projetos de larga escala que empregos serão gerados direta e indiretamente, como ocorreu após a 2ª guerra mundial, o que levou a um boom de empregos em virtude da grande demanda por mão de obra. Ademais, existe a proposta de digitalizar os serviços públicos com o fim de cortar custos operacionais. No entanto, é importante ressaltar que o gasto com projetos de alta magnitude e a diminuição da carga tributária podem ser variáveis que, quando combinadas, de fato geram um aumento do déficit público. O sucesso do projeto depende diretamente da velocidade de resultados, como a geração de empregos, que irá gerar novas cargas tributárias para o governo, além da eficiência de mecanismos para evitar o descontrole fiscal.
Nesse sentido, ainda não se sabe ao certo o que irá ocorrer no percurso da relação entre os dois, no entanto, há indícios de que os ventos mudam de direção. Primeiramente, após a grande rachadura Trump-Musk, o segundo invocou uma ideia de que o bipartidarismo (republicanos e democratas) limita aquilo que os “verdadeiros americanos anseiam”. Nesse sentido, provocou os internautas em seu perfil do X, questionando se os EUA deveriam ter um novo partido, aquilo que seria uma terceira opção. A maioria das pessoas votou “sim”, apesar de não sabermos exatamente a origem desses votos, ou seja, se os votantes são cidadãos norte-americanos. Não obstante, é importante ressaltar que não é possível prever os próximos passos de Musk, levando a uma incerteza que, cada vez mais, aumenta o tamanho de sua incoerência, haja vista que há menos de um ano, o bilionário declarou apoio incondicional ao presidente.
Por outro lado, o presidente dos EUA também porta-se de forma incoerente, ao dar um ar de possibilidade à deportação de Musk do país. Quando perguntado por um jornalista no dia 01/07/25 se iria deportar seu antigo aliado político, Trump respondeu: “vamos ter que dar uma olhada”, segundo a CNN Brasil. Não se sabe ao certo se a ação de deportar Musk é possível, uma vez que é cidadão americano naturalizado e, segundo a 14ª emenda do texto constitucional americano, todos os cidadãos estão protegidos de forma igual perante a lei. No entanto, por ser um cidadão naturalizado, é possível que sua cidadania seja “anulada” por meio de um processo judicial extremamente raro chamado “desnaturalização”, segundo a CNN Brasil. Ainda mais, o processo dá-se somente sob as condições de fraude intencional, omissão de fatos relevantes durante o processo de naturalização ou pertencimento a organizações terroristas ou nazistas. Então, vale salientar que os próximos passos a serem tomados pelos dois dentro desta peleja são imprevisíveis.
Portanto, aquilo que era, outrora, uma relação inabalável entre dois magnatas poderosos, hoje demonstra-se como uma rachadura que pode causar instabilidade no curso político e estratégico – considerando que Musk é detentor de empresas importantes no desenvolvimento científico de agências governamentais como a NASA – do país. Além disso, vale ressaltar, segundo o Washington Post, que os contratos governamentais da NASA e do Departamento de Defesa com a SpaceX representam a maior parte dos fundos da produtora de foguetes. Outrossim, a Tesla obteve US$ 11,4 bilhões em créditos regulatórios de programas federais e estaduais destinados a impulsionar a indústria de carros elétricos, e especialistas afirmam que suas vendas foram impulsionadas por um crédito fiscal federal de US$ 7.500 para consumidores de veículos elétricos.
Verifica-se, desta forma, que as empresas de Musk conseguiriam expandir suas forças ao longo dos anos através do orçamento governamental dos EUA. Obviamente, o patrimônio líquido do sul-africano também foi impulsionado por esse movimento. Por esta razão, possivelmente, ele tornou-se um grande crítico do projeto orçamentário de Trump, tendo em vista que, com a redução de impostos proposta, o governo terá menos verba para oferecer às suas empresas através dos contratos público-privados.
Referências bibliográficas:
https://www.bbc.com/portuguese/articles/c74qygxvg20o
https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/elon-musk-pode-ser-deportado-por-trump