Os 10 anos da Agenda 2030: o desenvolvimento pode ser sustentável?

Em 2015, a Organização das Nações Unidas propôs 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em substituição aos antigos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Assim, os ODS foram lançados por meio do documento “Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”, como um plano de ação a ser cumprido durante os 15 anos seguintes, com 169 metas para a implementação dos objetivos. 

Prestes a completar 10 anos, a Agenda 2030 apresenta avanços e desafios encontrados durante o caminho. Apesar de sua consolidação ao redor do mundo, os ODS seguem questionáveis em seu cerne: o desenvolvimento pode ser sustentável?

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e a construção de um novo paradigma para agendas globais

Os ODM foram um conjunto de 8 objetivos globais estabelecidos pelos países membros da Organização das Nações Unidas (ONU). Por meio do estabelecimento de metas e compromissos a serem atingidos até 2015, buscavam firmar normas internacionais em direção à paz, sustentabilidade ambiental, erradicação da pobreza, entre outros.

O conjunto de metas foi firmado em setembro de 2000, durante uma Assembleia Geral da ONU que ficou conhecida como Cúpula do Milênio, por meio do documento “Declaração do Milênio das Nações Unidas”. Desse modo, pretendia-se alcançar um novo paradigma no sistema internacional, que solucionasse problemas compartilhados pela humanidade com a instituição de valores fundamentais como liberdade, igualdade, solidariedade, respeito pela natureza e responsabilidade comum. 

Com esta finalidade, foram discutidos temas pertinentes à realidade comum entre os países, como paz, segurança, direitos humanos, democracia, grupos vulneráveis e cooperação internacional. Os ODM, portanto, buscam convergir as tentativas de ação conjunta em torno de desafios compartilhados, a partir da integração de compromissos e definição de metas que repercutiam os debates realizados em conferências anteriores.

Os 8 objetivos contemplam: 1) Erradicar a pobreza extrema e a fome; 2) Alcançar educação primária universal; 3) Promover a igualdade de gênero e a autonomia das mulheres; 4) Reduzir a mortalidade infantil; 5) Melhorar a saúde materna; 6) Combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; 7) Garantir a sustentabilidade ambiental; e 8) Estabelecer uma parceria global para o desenvolvimento. Além dos tópicos principais, os compromissos foram subdivididos em 21 metas e 60 indicadores oficiais, que adotavam como recorte temporal o intervalo de 1990 a 2015.

Foto: Impacta ODS

A formulação de uma agenda a ser seguida globalmente evidencia certa preocupação com a qualidade de vida da população mundial, considerando que a virada do milênio proporcionou um espaço de reflexão sobre os desafios enfrentados pelo planeta, que poderiam se agravar com o decorrer dos anos. Para além de questões humanitárias, os ODM também serviam a propósitos estratégicos, como o impulsionamento de acordos internacionais, a abertura política e a expansão de mercados.

A integração dos objetivos possibilitou o envolvimento de múltiplos setores da sociedade para além dos Estados, como organizações não governamentais, setor privado e sociedade civil. Além disso, proporcionou um monitoramento mais eficaz do progresso realizado, considerando a centralização dos dados por meio dos indicadores pré-estabelecidos. 

Conforme Okado e Quinelli (2016), dentro do intervalo de tempo proposto para a realização das metas, todos os objetivos obtiveram avanços significativos. Porém, é fato que 15 anos de cooperação em torno de 8 objetivos não seriam suficientes para corrigir desigualdades estruturais, como a pobreza e a questão de gênero. Sendo assim, com a chegada de 2015 e o fim do prazo estipulado para os ODM, foi observado que ainda havia um longo caminho a ser percorrido, dando início à construção de uma nova agenda que proporcionasse a expansão do movimento consolidado até então.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável como o caminho para o futuro


A nova agenda proposta pela ONU buscava, para além de reforçar os ODM, incorporar a promoção do desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, as ideias começaram a ganhar contornos precisos durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável. O evento aconteceu no Rio de Janeiro, durante junho de 2012, e ficou conhecido como Rio+20, e resultou no documento “O Futuro que Queremos”. A proposta era de que os países membros construíssem novas estratégias baseados na experiência dos ODM, voltados para o desenvolvimento sustentável, que entrariam em vigor após 2015.

Os ODS foram anunciados oficialmente em setembro de 2015, estabelecendo novos objetivos e metas para os próximos 15 anos. O documento “Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável” foi organizado em torno de 5 Ps: 1) Pessoas; 2) Planeta; 3) Parcerias; 4) Prosperidade; e 5) Paz, que orientam os princípios gerais das metas a serem alcançadas. Para isso, foi instituído um plano de ação com 17 objetivos, que podem ser observados na imagem abaixo.

Foto: Nações Unidas Brasil

A partir das diretrizes colocadas, os Estados possuem autonomia para agir conforme o que é considerado prioridade interna. Os ODS carregam como mantra o compromisso de que “ninguém seja deixado para trás”. Portanto, é reforçado o caráter cooperativo e coletivo da agenda.

Apesar de assimilar diversos elementos dos ODM, os ODS vêm com um elemento inovador: uma tentativa de enquadramento da sustentabilidade dentro de uma agenda global para o desenvolvimento, de forma ampla. Para isso, são incorporadas as três dimensões do desenvolvimento sustentável: a econômica, a social e a ambiental.

Desse modo, o desenvolvimento sustentável é inserido como um conceito que sugere que o crescimento econômico pode ser aliado ao progresso em demais níveis, em que se destaca a proteção ao meio ambiente. A ideia proposta é de que é possível suprir as necessidades atuais sem comprometer a capacidade de atender às gerações futuras, o que perpetua a lógica que sustentava os ODM: a preocupação com a qualidade de vida da população que ainda está por vir depois de nós. Assim, os padrões de consumo podem ser conciliados com a sustentabilidade, utilizando os recursos naturais de forma mais consciente por meio deste modelo de desenvolvimento.

O enquadramento da sustentabilidade nas métricas de desenvolvimento internacional

Após 10 anos de sua criação, os ODS se tornaram um trending topic conhecido e difundido nas relações internacionais. O impulsionamento da agenda por meio do apoio promovido pelo Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (PNUD) possibilitou a criação de parcerias entre atores estatais e não estatais, e o financiamento de projetos que carregam os ideais propostos. 

Apesar dos avanços, nota-se que a própria definição de desenvolvimento sustentável é, em seu cerne, contraditória e reducionista. Autores como Boff (2023) e Cruz e Ferrer (2015) apontam para seu viés estritamente economicista, que na prática mascara o crescimento econômico sob o pretexto de uma preocupação superficial com a proteção ambiental. 

É inerente à produção industrial a extração de recursos, a produção e o consumo em massa, que sustentam a roda girando e estão associados ao desenvolvimento econômico. Tais valores contribuem para o aumento da desigualdade social e para o colapso ambiental da atualidade. Um exemplo disso é a crise climática, que possui como uma de suas causas a emissão de gases do efeito estufa gerados por indústrias. Nessa perspectiva, o desenvolvimento econômico é incompatível com a sustentabilidade, sendo conceitos antagônicos que não podem ser conciliados e reduzidos a uma categoria única.

Na busca por soluções que evitem o fim do mundo em 15 anos, a ONU é ambiciosa em apostar no desenvolvimento sustentável como o caminho mais palpável para o futuro. É fato que os ODS têm contribuído significativamente para a integração da sustentabilidade à política, sociedade, cultura, etc., por meio da visibilidade conferida ao tema e do impulsionamento de projetos e programas na área. No entanto, é necessário frisar que a agenda também serve propósitos estratégicos, sendo ambígua em seu cerne ao afirmar que é possível conciliar o desenvolvimento econômico com a promoção de um futuro sustentável.

Referências

http://cienciaecultura.bvs.br/pdf/cic/v71n1/v71n1a11.pdf

https://seer.pucgoias.edu.br/index.php/baru/article/view/5266/2892

https://brasil.un.org/sites/default/files/2020-09/agenda2030-pt-br.pdf

https://www.un.org/millenniumgoals

https://brasil.un.org/pt-br/66851-os-objetivos-de-desenvolvimento-do-mil%C3%AAnio

https://engemausp.submissao.com.br/25/anais/arquivos/596.pdf?v=1743590213